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sexta-feira, 3 de junho de 2011

O Consumo de Energia na Alemanha, Ou Angela Merkel Blefou.

Na segunda feira 30/05 pp, a chanceler alemã Angela Merkel veio a público para dizer que a Alemanha iria encerrar a produção de energia em seu território a partir de reatores termonucleares até 2022. De pronto puxei o freio e recuei os flaps para nível zero. HEIN? Foi a primeira coisa que me veio à cabeça.
Como engenheiro eletricista custava-me crer que uma potência industrial como a Alemanhã tenha opções para fazer tal operação em tão pouco tempo, mesmo sem conhecer a matriz energética teuta.

Postei no twitter e alguns comentaram sobre o tema. Falei que ia estudar e aqui estou. Ao final citarei as fontes consultadas. Sigamos.

É certo que o consumo de energia na Alemanha vem diminuindo desde outubro de 2008, tomando como base as informações da Confederação Alemã das Empresas de Água e Energia. Nos primeiros três meses de 2009, o consumo de energia elétrica no país caiu cerca de 4%, enquanto o recuo no consumo de gás foi de 6%, sendo a queda motivada pela diminuição do consumo pela indústria, que responde por 40 a 45% do consumo total de gás e eletricidade no país, dentro das minhas espectativas desde o começo, pelo poder econômico do seu parque fabril, e tomando como referência o perfil brasileiro. Mesmo com a crise global, o consumo residencial e comercial pouco se alteram, pois suas infuências de oscilação estão mais ligadas a fatores climáticos e sazonais.

A matriz de energia alemã é composta basicamente de usinas termelétricas de fontes energéticas não renováveis: carvão mineral (50%), urânio enriquecido (26%) e gás natural (11%). A geração anual de energia elétrica está na casa dos 650 TWh. A titulo de comparação, com maior território e população, a produção brasileira é menor, em torno de 400 TWh anuais, ambos os dados de meados de 2008 (foi o que consegui de mais recente disponível para comparar, mas que não deve ter-se alterado desde então. Falo por experiência na matéria).Estamos pois falando de substituir 1/4 de tudo que se consome no país. E por qual fonte? Tentem imaginar isso no Brasil e dá prá se imaginar a encrenca que é.
Sabe-se que a Alemanha tem projetos arrojados em geração eólica, assim como os países escandinavos (Dinamarca, Noruega, Suécia e Finlândia), o Reino Unido e a Holanda, aproveitando as fortes correntes de vento do Mar do Norte, tanto que planeja um gigantesco parque eólico offshore, com 30 usinas no Mar do Norte e no Mar Báltico com capacidade de até 25 mil megawatts até 2030, com as plantas instaladas entre 40 e 80 quilômetros do litoral, missão ousada já que em outros países, como na Dinamarca, a Holanda e o Reino Unido, as turbinas ficam a apenas poucos quilômetros da costa.
Lindo e ecológico não é? Só tem um pequeno problema: o projeto da instalação do tal parque eólico offshore representa também um grande desafio financeiro e tecnológico. Cada empreendimento custa 1 bilhão de euros e a instalação de cabos submarinos custa aproximadamente 1,5 milhão de euros por quilômetro. Os desafios tecnológicos e logísticos envolvem a instalação desses cabos no fundo do mar, a fixação das turbinas nas plataformas a mais de 25 metros de profundidade, as dificuldades de protegê-las da corrosão e garantir a operação e manutenção do parque em meio às constantes, violentas, traiçoeiras e imprevisíveis tempestades do Mar do Norte.

Sem contar o desenvolvimento das próprias turbinas. Os maiores fabricantes mundiais ainda engatinham em unidades onshore e têm acontecido inúmeros acidentes com suas unidades (leia AQUI), sem contar os efeitos sobre o meio ambiente. Para incentivar esses investimentos, o governo alemão elevou a tarifa paga aos proprietários de sistemas de energias renováveis fornecida à rede pública (feed-in tariff) para energia eólica produzida no mar de 9 para 15 centavos de euro, eliminando uma das barreiras para o seu desenvolvimento. Mas para garantir o mínimo de impacto ambiental, protegendo o ecossistema marinho e regiões de proteção ambiental, o investidor tem que submeter seu projeto a uma monitoração ambiental rigorosa durante mais de um ano para adquirir a licença de instalação.
Portanto esse caminho nem é fácil, nem rápido, nem barato.
Como a "fatia de vento" da pizza acima não deve evoluir tanto assim, vamos em frente nas outras.

A poderosa nação de Johann Sebastian Bach, emite em torno de 900 milhões de toneladas métricas de dióxido de carbono, sendo uma das campeãs. A União Européia espera que a Alemanha cumpra sua meta de reduzir esta produção em 21% em relação à linha de referência de 1990, logo a fatia carvão é impraticável de se aumentar, mesmo sendo ela detentora da maior reserva de carvão do continente, e mesmo assim através de importação da Polônia (23%), África do Sul (22%) e Rússia (20%).
No setor de gás natural, a sua produção atende apenas 20% da demanda nacional para geração de eletricidade e o país importa GN da Rússia, Noruega e Holanda, para atingir em torno de 100 bilhões de m3 por ano, com o país de Piotr Ilitsh Tchaikovsky representando quase 50%, o que irá requerer enormes negociações diplomáticas e comerciais e futuras dependências insuperáveis, o que não condiz com o perfil alemão. Some-se também as dificuldades ecológicas, tecnológicas e financeiras para a construção de novos gasodutos.

Desnecessário é trabalhar em cima dos 9% restantes da pizza.

Logo, a determinação e euforia de dona Angela deverão esbarrar em coisas sobre as quais o domínio não é completo e o poderio alemão pode se esvair.
Resta ainda uma saída "limpa": deixa o couro comer na produção de energia por carvão e compra créditos de carbono de países emergentes como o Brasil, por exemplo.

Eita: que coincidência. Estamos em vias de aprovar um novo código florestal no país. E como tem ONG européia brigando por isso né?


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