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sexta-feira, 22 de julho de 2011

Carta de Arthur Virgílio a Geraldo Alckmin





Lisboa, em 21 de julho de 2011
Prezado Geraldo,

O Amazonas foi traído pela presidente Dilma Rousseff no episódio dos tablets. Concedeu incentivos que os direcionam a São Paulo e, com isso, pode ter aplicado golpe de morte no Polo Industrial de Manaus.
Agora você desonera a produção desse artigo tão relevante, cumprindo, certamente, seus deveres de governador do principal estado da Federação. Ora, a presidente se decidiu por São Paulo, não haveria, então, de ser logo você a recusar a generosa oferta.
Na minha lógica, se Dilma não houvesse editado a MP 534, os tablets iriam para Manaus, mesmo que você tomasse a atitude que tomou. Daí a insistência com que me disponho a entender o governador.
Só não o entendo mais, aliás, porque você não é um governador qualquer, restrito às fronteiras paulistas, candidato a presidente da República que foi e nome presidenciável que é. O governador local, que só aspire a dirigir seu estado por quatro ou oito anos, cumpre seu papel e vira as costas para o resto do Brasil. Do governador nacional, que conhece o País e seus problemas, se espera visão global, percepção de conjunto da realidade complexa e multifacetada que nos envolve.
Escrevo-lhe, pois, para registrar a incompatibilidade que vejo entre essa forma de governar São Paulo e as necessidades do Amazonas, do Nordeste, do Centro-Oeste. Dilma, que recebeu quase todos os votos do meu estado, traiu a expectativa nela depositada. Você não traiu nada e nem ninguém: apenas, mais uma vez, esqueceu que perder um pouco no curto prazo pode significar ganhos políticos e até econômicos para São Paulo.
Veja que não me refiro a ganhos políticos para você, mas para São Paulo, hoje visto como estado predador, que se distancia dos demais entes federados e, não raro, os esmaga. Por igual, quando me refiro a ganhos econômicos, penso num Brasil equilibrado, que consuma mais, produza mais, enriqueça mais, negocie mais com São Paulo e participe, forte e justamente, da prosperidade do povo que você governa.
Esqueçamos, se é que podemos, os tablets. Lembremo-nos dos celulares, das inúmeras – e inconstitucionais – medidas restritivas adotadas contra uma área de exceção, garantida pela Constituição, que é a Zona Franca de Manaus. Trata-se, claramente, de uma postura: não abrir mão nunca de nada, sem desconfiar de que isso consolida o crescente rancor brasileiro contra o admirável estado que você dirige.
A Zona Franca se estriba em incentivos fiscais? Claro que sim. Castelo Branco e Roberto Campos tiveram a lucidez de perceber que se deveria incentivar região pobre e estratégica. A França fez isso com o seu Midi, a Itália com o seu Mezzogiorno, os EUA com o Tennessee Valley.
O Brasil fez isso a favor de São Paulo a vida inteira. Ou não foi assim quando JK decidiu que a indústria automobilística seria majoritariamente paulista? Quando o presidente Collor criou a Lei de Informática? Quando Lula, recentemente, fez todas as concessões fiscais possíveis e imagináveis para socorrer as montadoras de automóveis?
Quando se trata do Amazonas, certa imprensa torce o nariz. Ignorando o peso do Polo de Manaus para a manutenção da floresta em pé. Esquecendo o seu valor para a segurança nacional. Olvidando o seu significado econômico, com reflexos generosos para o próprio São Paulo.
Sugiro-lhe que faça um exame dos contenciosos paulistas com os demais estados. E espero que compreenda a decisão que tomei.
Sem nenhum prejuízo para a admiração que nutro por sua competência e sem nenhum arranhão na amizade que lhe dedico, saiba que, doravante, estarei impossibilitado de me alinhar politicamente ao seu lado. Pelo menos até o momento em que os governos de São Paulo e do Amazonas sentem à mesa de negociação e acertem modo harmonioso e justo de convivência.
Escrevo-lhe quando estou sem mandato, “exilado” em Lisboa e você desfruta de situação política confortável e forte. É melhor que seja assim. É mais o meu estilo. O contrário talvez me inibisse e constrangesse.
Se seu (alto) limite é se restringir a São Paulo, meu dever é defender o Amazonas.
Recomende-me à Lou e aos meninos e receba meu mais cordial abraço.

Arthur Virgílio

COMENTO: E muitos de meus conterrâneos amazonenses preferiram dar o voto em troca de trinta dinheiros dos cartões do Bradesco para a onça pintada de Santa Catarina, para ser mais uma genuflexa no senado da república.

2 comentários:

Anônimo disse...

Querido Cacique
A "boca de bagre" não é de SC, é de SP.
Caiu aqui de pára-quedas, mas espatifou-se no chão.
Não levou nada.
Por isto mesmo mereceu altos cargos no gov federal.
Parabéns Sr. Arthur Virgílio!

Rose disse...

Mestre Cacique
A população de SP trabalha tanto e perde muito tempo no trânsito, por isso nem tem tempo pra se inteirar dessas questões.
Mas tenho certeza que muitos estão aqui iludidos pela propaganda redentora de setores como o automobilístico, muito bem lembrado por você, o mais privilegiado pelo padrinho Lula da Silva.
Pois eu te digo que essa disputa entre estados só satisfaz gente sem caráter ou sem noção.
O que queremos é o Brasil de Todos anunciado pelos marqueteiros e que estamos esperando há quase nove anos.