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quinta-feira, 10 de março de 2011

Pensando o Processo

Pensando o processo por Mara Kramer

Exponho abaixo, de forma panorâmica, minha visão sobre o processo das ideologias de esquerda, basicamente o PT, no Brasil. Minha reflexão não visa prioritariamente entender a trajetória do partido, mas sim, compreender a realidade a ser enfrentada pela resistência ao partido neste momento no país. Considerando ser uma percepção pessoal, logicamente apoiada em fatos, abro o tema à discussão com a finalidade de conhecer outras visões, sempre priorizando não a história, mas suas conseqüências na realidade e propostas de ação.

A pretensão da esquerda marxista era a universalidade, pois apenas na universalidade o sistema poderia funcionar e crescer. O mesmo ocorre com o capitalismo, apenas na universalidade, ou globalização, ele pode manter-se e evoluir. Ambos os modelos buscavam a universalidade, e nesta disputa, muitas vezes avançando na esfera político-territorial, o capitalismo venceu. A queda do muro em 89 é o acontecimento simbólico da derrota do comunismo. Vivemos hoje na América Latina um "último suspiro" desta esquerda, já em uma versão mista com o capitalismo. Outra versão mista também esta na China, mas esta deu indícios claros na última visita do presidente chino aos EUA há 15 dias mais ou menos, que irá, mesmo que a seu ritmo, iniciar o processo de democratização. Está também o fechado regime da Coréia do Norte. Considerando apenas um aspecto do modelo econômico a vitória do capitalismo sobre o comunismo não deixa espaço para a expansão de um partido de tipo petista (original e pretensão), exatamente pela impossibilidade de universalidade. A Europa, América do Norte, Japão, Rússia, Índia, entre muitos outros países, não retrocederão ao marxismo. Quero dizer com isto que, entre outras coisas, a pretensão do PT expandir-se pelo mundo, como demonstrou em sua política externa, não tem o menor futuro, ou seja, não se expandirá. A política exterior de Lula, sobretudo no final do governo (Honduras, Irã, caso direitos humanos de Cuba) não caiu bem na comunidade internacional. Lula ainda é a figura folclórica do operário que chegou a presidência, mas não alcançará nenhum posto de transcendência nos órgãos internacionais. A ausência de grandes figuras na posse de Dilma evidencia, entre outros fatos, a queda do prestigio internacional de Lula.

Intelectuais da esquerda especularam que o avanço da esquerda na América Latina poderia ser o indício de seu retorno, entretanto a qualidade de governo e os avanços sociais reais não sustentam esta expectativa. Há até uns 4 anos atrás as livrarias européias resgatavam escritores e escritos da esquerd (Marx, Gramsci, Marcuse, Lukács, Hauser, etc). Encontrava-se nas vitrines das livrarias estes livros com freqüência. Atualmente, já não se vê, em parte por que a crise passou a ser protagonista, mas também pela insustentabilidade do discurso de Chavez, Lula, ou Raul Castro e a difusão da resistência cubana, etc.

No mundo intelectual europeu o comunismo acabou em 1939 quando Stalin e Hitler assinaram o pacto de não agressão. Neste momento Stalin, líder comunista se equipara a Hitler, líder nazista, caindo por terra as pretensões de superioridade moral da esquerda. Ambos eram capazes de ser monstruosos, como de fato o demonstraram. De lá até 1989 foi a agonia do moribundo.

Retomo as palavras do Frei Beto, quando disse que Lula conseguiu aquilo que a direita brasileira jamais havia conseguido, acabar com a esquerda no país, pois boa parte da intelectualidade de esquerda abandonou o PT. As pessoas que eram petistas na ilusão da justiça e igualdade social, ou por nostalgia da juventude revolucionária também abandonaram o PT. O partido hoje é dos aproveitadores, dos vigaristas, dependentes da compra de votos. Enfim, daqueles que tiram vantagem ou têm benefícios assistenciais. Poucos são os petistas por convicção, descontando o fanatismo. A intelectualidade brasileira não apóia mais o PT, foi o que ficou comprovado no Manifesto pela Democracia realizado no ano passado, e, senão me engano, a USP não votou PT nas últimas eleições. Ou seja, o PT perdeu as bases intelectuais que o apoiaram e deram sustentabilidade e legitimidade ao seu crescimento. A princípio, a morte do PT iniciou no mensalão. Digamos que o mensalão foi o nosso "pacto de não agressão". O mensalão demonstrou que a bandeira de superioridade moral levantada pelo PT era falsa, ele podia ser igual ou mais corrupto do que aqueles a quem criticava. No mensalão Lula/PT morreu moralmente. Entendo, por exemplo, que é este o motivo pelo qual o Diogo Mainardi não vê mais graça na política lulista/petista, perdeu o interesse, escrevendo inclusive um livro deste "fim de caso". A partir daí é apenas “más de lo mismo”, imoralidade, imoralidade,.... Neste sentido, o PT é inviável não apenas no sentido de expansão internacional da esquerda, mas também, e sobretudo, por sua decadência moral. Assim, creio que o PT, como todos os partidos de ideologia marxista, estão vivendo no Brasil a agonia do moribundo. Corrobora nesta avaliação a alteração de rumo de Roberto Freire e o PPS.

A partir daí a questão passa a ser até quando nós poderemos suportar. O povo egípcio suportou 30 anos, a Venezuela já esta em torno de 15, a Espanha esteve sob o regime franquista até a morte de Franco (36 anos), a Itália, entre idas e vindas, esta há 10 anos com Berlusconi, nós estamos entrando no nono. Um aspecto que joga a nosso favor é exatamente a necessidade de universalidade do capitalismo, hoje mais do que nunca, pois já em fase de globalização, e a tendência, cada dia maior, dos países assumirem a democracia, conforme assistimos nas amplas manifestações populares nos países árabes.

Também não sabemos quanto o PT resistirá, até quando isto irá durar, nem o nível de desconstrução moral, política e econômica podemos alcançar. O estrago já é grande e vai aumentar. Colocar o limite dependerá da politização de nossa sociedade, de nossa organização e mobilização, da organização, ação e ética dos partidos de oposição, em última analise do sentido de moral interiorizado pela nossa sociedade e da maturidade de nossa cultura política, tanto do povo quanto dos políticos (o que é dialético). Neste sentido, o quanto antes iniciamos o debate político, os questionamentos, a revisão de posturas histórica, pressões e manifestações, quanto melhor orientamos nossos debates e ações, a velocidade de organização, profissionalização e conscientização da importância de oposição, etc......melhor.

NB: Mara Kramer, é nascida em Porto Alegre, arquiteta, ex-professora universitária trabalhando com história e teoria da arquitetura. Mora em Barcelona onde faz doutorado em arquitetura na sua área de atuação docente. Como professora e pesquisadora de arquitetura trabalhou em investigações, escreveu artigos e livro, organizou e participou de vários seminarios e congressos. Recomendo seguí-la no Twitter @MarKramer

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