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segunda-feira, 25 de março de 2013

CONSIDERAÇÕES SOBRE O ABORTO


CONSIDERAÇÕES SOBRE O ABORTO

Pelo Conselheiro Federal Julio Torres.

1) CONCEITO:

A palavra ABORTO, o verbo ABORTAR, significam, fora de qualquer dúvida ou interpretação, interromper algo que já começou. Por exemplo: um avião está na pista acelerando as turbinas para decolar e, rapidamente, surge um grave impedimento; o comandante ABORTA a decolagem.

Do ponto de vista da vida, EVIDENTEMENTE, também significa interrompê-la. Sabemos, que a vida animal principia com a fecundação, embora haja opiniões contrárias a isto. Se o espermatozoide for de um homem e o óvulo de uma mulher, a vida que surge é um novo ser humano, masculino ou feminino, desde o seu princípio, desde os primeiros segundos após a fecundação. O número de gametas, contidos nos cromossomas, metade no espermatozoide e metade no óvulo, constituirão, de forma absolutamente fantástica, (por certo um dos eventos mais belos da natureza biológica) um novo ser humano. Quase TUDO, as qualidades físicas e algumas psíquicas, estão ali contidas. Apesar do gigantesco crescimento da ciência ainda há muito a ser descoberto. Por falar em cromossomas, embora as nossas qualidades físicas e psíquicas humanas sejam imensamente superiores, a diferença entre as nossas qualidades genéticas e a dos macacos superiores que mais se aproximam dos humanos é de somente 1,8%.

Há algumas convenções criadas a título de conceitos, MAS, não passam de convenções, de teorias diversas. Exemplos: a) a vida humana começa quando o óvulo fecundado se fixa no endométrio, isto é, após a nidação. b) a vida humana começa 10 a 12 semanas depois da nidação; porque? antes disso o que é? como se chama? .

Pode, também, surgir a convenção de que a vida humana só começaria quando o corpo do feto estiver completo, ou, como ele se nutre e é oxigenado através da placenta, quando nascer, quando começar a respirar e for amamentado. Por outro lado a multiplicação celular acontece desde a fecundação até a morte do ser humano, não se interrompe em momento algum, nem mesmo por algumas horas para dar continuidade depois.

MAS...a ciência e todos nós sabemos, que a vida humana principia com a fecundação de um óvulo de mulher com o espermatozoide de um homem. Mesmo que se levasse em consideração outras afirmações diferentes desta, haveríamos de considerar que “in dubio pro reu”, como faz a justiça diante de casos de condenação duvidosos. “In dubio pro feto”, valeria dizer.

A vida merece respeito em todas as suas dimensões.

2) A GRAVIDEZ INDESEJADA E A BUSCA DO ABORTO

Para a felicidade geral e o bem de todos a gravidez deveria ser sempre desejada e planejada, mas, infelizmente, nem sempre acontece assim, quando a mulher ou o casal deseja. O relacionamento sexual também deveria ser, além de desejado, consciente e responsável. A gravidez é uma consequência e as pessoas tem que ser responsáveis pelos seus atos; quem tem porte de arma, por exemplo, deve ser responsável pelo seu uso, não pode deixá-la em qualquer lugar vindo a ser usada de forma irresponsável. Mas, infelizmente, o mundo não é assim.

Todas as pessoas, especialmente as mulheres, deveriam conhecer e cuidar de sua fertilidade. Este processo educativo deveria passar da mãe para as filhas (pois elas é que têm períodos de alternância de fertilidade). Se todas fossem educadas desta forma o nosso mundo seria muitíssimo melhor. Mas, infelizmente, não é assim.

Porque mulheres, muitas delas maravilhosas, procuram e fazem o aborto? Devem ser punidas? Primeiro, elas já foram punidas; sofreram porque não foram amadas e sofrem amargamente para tomarem esta decisão. Pode acontecer também, o que provavelmente é raro, que ela nem sabe o que lhe está acontecendo, não saiba o que é o aborto, julga que é somente um “limpeza” a ser feita em seu útero. Muitas sofrem porque não queriam abortar mas o parceiro a induziu, rejeitou a gravidez, a paternidade, não se responsabilizando por ela. Há um imenso número de causas: o medo dos pais, o medo de perder o emprego, o medo de ser rejeitada (a “mãe solteira”), medo de enfrentar uma sociedade sem valores. Há mães e pais que dizem: “não me traga filhos para criar antes do casamento”, mas não orientam seus filhos sobre a responsabilidade sexual; estão dizendo que vale mais um filho (a) que manda abortar do que um filho (a) que tem coragem de dizer: “aconteceu, agora me ajudem”.

Ao longo de 40 anos, como casal, minha esposa e eu ( sobretudo ela) conversamos e demos muitas palestras sobre o ABORTO, tanto para jovens como para adultos, explicando-lhes em detalhes de que se tratava, sendo assistidos por pessoas que haviam feito ou iam praticá-lo; certa vez uma senhora estava com o aborto marcado em uma clínica, porque tinha se separado do marido há algum tempo e estava com um outro bom relacionamento; mas, suas filhas adolescentes, não sabiam da gravidez nem do relacionamento; por medo de enfrentá-las de cabeça erguida, por medo de perder o emprego, por medo de enfrentar uma sociedade hipócrita e sem valores resolveu assim proceder. Após assistir a palestra que era dirigida para adolescentes (ela era professora deles), tendo ouvido falar que ninguém quer matar seu filho mas procura o aborto para se livrar de problemas, resolveu mudar de comportamento; comunicou às filhas, elas aceitaram e ficaram felizes, e sua gravidez foi até o fim. Muitos anos depois minha esposa a encontrou, juntamente com este filho, e dela ouviu que sua vida mudou totalmente e a felicidade a envolveu. Há um elevado número de casos desta natureza na nossa sociedade. Basta para isso que pessoas de bom senso e de coração limpo as ajudem.

Por outro lado o aborto provoca sequelas físicas e psicológicas tremendas pelo resto da vida em muitas mulheres que o praticam. TODOS SABEM DISSO. Com certeza o aborto não é a melhor das as soluções para este tipo de problema. É uma questão de valores e não de saúde pública. Não é uma outra violência que vai ajudar a quem já está violentada; é uma violência para tentar corrigir uma outra sem bons resultados. Porque a mulher foi vitimada e agora surge uma nova vítima, a criança, que nada tem a ver com isso? Não tem sentido.

Muita coisa pode ser feita para ajudar as mulheres que estão em dificuldades por causa de uma gravidez e até já existe ............. Conversar profundamente com elas, convencê-las a terem seu filho, ajudá-las do ponto de vista médico assistencial e, na última hipótese, possibilitar a doação de seu filho para outrem; conhecemos muitos casos assim. Matá-lo é que não é justo.

Por outro lado, nós que vivemos no meio médico diuturnamente, assistimos inúmeros casos de injustiça na sociedade em que vivemos; pessoas que necessitam de tratamentos comuns, rápidos e eficientes não são atendidas; há filas imensamente grandes, falta de leitos hospitalares, falta de medicamentos e por aí afora. Além disso um elevadíssimo número de clínicas e hospitais fecharam suas portas por falta de uma remuneração compatível com suas despesas; faliram.

Se o aborto vier a ser legalizado será que as pobres o terão como algo garantido? COM CERTEZA NÃO, A NÃO SER QUE VENHA A SER PRIORIZADO, O QUE SERIA UM ERRO ABSURDO NA SAUDE BRASILEIRA. As mulheres ricas e bem de vida o teriam com facilidade; com as pobres jamais aconteceria o mesmo, a não ser que, de forma absolutamente injusta, viesse a ser bem remunerado pelo SUS. Por outro lado, o mesmo aconteceria com os planos de saúde; se ele viesse a ser muito bem remunerado haveriam diversos médicos o realizando; caso contrário, como acontece atualmente com diversas condutas médicas, as filas ficariam imensas. Ainda uma pergunta sobre este assunto: e os homens que as engravidaram, nada acontece com eles?

Mais uma: se chegar o dia em que formos o ÚNICO país do mundo sem a legalização do aborto sentir-nos-emos profundamente honrados pela JUSTIÇA HUMANA pois a VIDA estará valendo mais em nosso país que em todos os outros. Pensemos nisso.

3) A INFLUÊNCIA DA RELIGIÃO.

Muito se fala que no Brasil não há aborto permitido por causa das religiões. Vamos considerar este aspecto.

A questão central de todas as religiões é a FÉ EM DEUS. Há os que acreditam, os que têm dúvidas sobre crer ou não crer e os que absolutamente não creem. Os duvidosos são denominados de agnósticos (do grego a – sem; gnosis – conhecimento). Os que absolutamente não creem são chamados de ateus ( do grego: a -sem; theos - deus.

Nas nossas sociedades, considerando os humanos a nível internacional, existem pessoas destas três estirpes e outras que nem sequer pensam no assunto e não se posicionam. A FÉ é uma decisão pessoal, é algo que decidimos pessoalmente fazendo uso da nossa liberdade absoluta. Repito, acreditar ou não em DEUS é uma DECISÃO PESSOAL. Vou citar três grandes gênios do conhecimento humano.

Principio por Pascal, Blaise Pascal, matemático, físico e filósofo francês do século XVII; disse ele: “Deus existe ou não existe, em qual das duas hipóteses você aposta? É importante apostar”.

Aluísio Bezerra Coutinho, se dizia agnóstico; foi meu professor da disciplina chamada de Patologia Geral na Universidade Federal de Pernambuco e era um gênio; médico competente, patologista, filósofo, pensador e um professor dos mais brilhantes que tive até hoje; suas aulas eram gravadas e transformadas por nós em apostila, pois o conteúdo não poderia ser encontrado em livro algum, tão sublime que era. Ainda hoje eu a guardo como uma espécie de relíquia. Alguns anos depois publicou um livro intitulado História e Filosofia das Ciências e nele estão escritas algumas citações que vou fazer. “O casualismo ateu levado até suas consequência finais, tais como foram delineadas por Monod, não deve ser visto a maneira de uma justificativa para a fé no Criador. Quem recebeu o dom da fé não tem necessidade de justificação. Um problema científico não é uma questão religiosa. Mas os que possuem a fé podem reconhecer a compatibilidade dos desenvolvimentos e, se cabe a um agnóstico opinar, ver até na automontagem das moléculas segundo o padrão neumanniano o modus faciendi divino”. Referia-se a uma interpretação da criação da vida a partir do nada absoluto.

Referindo-se de novo à origem da vida escreve: “É claro que a produção do primeiro autômato autoreprodutivo (refere-se ao primeiro ser vivo), neumanniano, construído de matéria orgânica por automontagem fortuita pode ocorrer em qualquer parte do universo onde as condições se apresentarem, ou seja, qualquer poça de “sopa orgânica primitiva”. Mas, a probabilidade de tal acontecimento fortuito, casual, aleatório, estocástico, palavras estas todas que expressam e dizem resultar do puro acaso, é de ordem de grandeza muito próxima do zero, mas positiva. Estimativas comparáveis são tradicionalmente bem conhecidas na filosofia das ciências naturais como a probabilidade que pode haver de um grupo de macacos batendo ao acaso no teclado de uma máquina de escrever, vir a compor o texto exato das obras de Shakespeare, ou da bem maior probabilidade de vir a se automontar um cronômetro se sacolejar numa urna um amontoado redundante de peças de um relógio”.

Francis Collins é um cientista mundialmente conhecido, que descobriu e descreveu com detalhes o genoma humano há relativamente pouco tempo e é Diretor do “Projeto Genoma” nos Estados Unidos. Até os 27 anos de idade era ateu, e, após cursar Medicina, descobriu os fundamentos lógicos e benéficos da fé. Escreveu um livro intitulado “A Linguagem de Deus”; nele apresenta evidências pessoais de que Ele existe. É um livro fantástico.

Diante do exposto volto a dizer que a fé é uma decisão pessoal; assemelha-se ao AMOR; é uma DECISÃO, das melhores que há na face da terra. Se fôssemos raciocinar em termos matemáticos seria muitíssimo mais provável que Deus existe de que ele não existe.

À luz da FÉ a vida é um DOM de Deus; é Ele quem mantem esta infinita beleza entre nós, os humanos. Porisso ela merece absoluto respeito. Abortar é como jogar fora algo absolutamente precioso.

A FÉ contém princípios tão lógicos que nutrem a RAZÃO; se forem desenvolvidos aos poucos e fortemente, enchem o interior das pessoas de um bem querer imensamente grande e aumentam a felicidade. Além de muitas, leva os humanos à prática da caridade, que, com certeza, promove grandes melhoras na sociedade. A meu ver e conforme meus sentimentos interiores só ela se situa acima da prática médica. Juntas, a FÉ e a MEDICINA, são capazes de consagrar as nossas vidas.

MAS, há pessoas que não decidiram nem decidem crer e são criaturas absolutamente fantásticas pelo seu bem querer interior, pela sua honestidade, pela sua dedicação aos outros. Por outro lado há pessoas que dizem crer em Deus, praticam a religião e se comportam erradamente. Há de tudo.

Repito, A FÉ É UMA DECISÃO PESSOAL; não significa que não crer é um erro, nem algo que candidate as pessoas à desumanidade.

Crendo ou não em Deus e nas religiões a VIDA com sua beleza e perfeição se situa muito acima das simples considerações humanas. Santos muito antigos da Igreja Católica diziam que a alma se incorporava ao corpo em diferentes tempos depois do início da vida dentro da mãe; nada disso interessa. Se Deus existe ou não, se temos ou não uma alma, nada disso interessa diretamente ao raciocínio sobre a vida e sua interrupção que estamos tratando aqui. O que interessa é que a vida humana é algo que merece respeito e não temos o direito de interrompe-la pelo fato de ter surgido sem ter sido desejada pela mãe, pois é uma outra vida; a vida de uma outra pessoa.

4) INFLUÊNCIAS ECONÔMICAS:

Há um interesse econômico internacional altíssimo em cima desta medida dos governos com a finalidade de legalizar o aborto. Há informações de que diversas entidades americanas investem bilhões de dólares para convencer países à sua prática; o motivo central desta conduta é a diminuição de pessoas pobres no mundo pois as ricas já dispõem da prática do aborto ilegal; estes, os pobres, colocam em risco a economia dos ricos. Se, ao contrário, aos pobres fossem fornecidos meios para viverem melhor, mesmo sem enriquecerem, o mundo melhoraria bastante e seria muito mais humano e justo. Tais entidades querem diminuir as populações menos favorecidas com a finalidade de enriquecer as sociedades. Por este motivo criam números irreais de pessoas que morrem pela prática do aborto ilegal e que não são confirmados pelas estatísticas verdadeiras.

Por falar nisso, é importante lembrarmos, que em diversos países europeus as populações que passaram a controlar rigorosamente a natalidade estão diminuindo e pessoas de outras nacionalidades, de outros continentes, estão migrando para lá, gerando conflitos sociais. A causa básica disso é o desamor, o desinteresse em ter filhos, o que é uma pena.

5) POSIÇÃO DO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA

A nossa entidade representa a totalidade dos médicos brasileiros ou estrangeiros que vivem e trabalham no nosso país. Se considerarmos esta totalidade concluímos que há um elevadíssimo número de colegas que não aceitam a legalização do aborto no Brasil por entenderem que é injusta a sua prática. Consequentemente, pela lógica, pelo uso da razão, não poderemos, enquanto entidade superior, emitirmos pareceres a favor, que servirá de base aos políticos que pretendem legalizá-lo. Dada a complexidade da questão será muito mais lógico comunicarmos à sociedade que o assunto foi amplamente discutido em nosso meio e que se chegou à conclusão que não é da nossa competência aprová-lo ou não. Que os políticos resolvam conforme suas consciências ou recorram à consulta da população através de um plebiscito, o que seria muito mais justo.

Aí sim, se o fizermos, estará claro o nosso respeito ao pensamento do povo e dos médicos brasileiros em geral sobre tão polêmico assunto.

SOBRE O AUTOR

• JULIO RUFINO TORRES é médico, especialista em Ortopedia e Traumatologia, mora em Manaus, capital do Estado do Amazonas e é membro titular do Conselho Federal de Medicina.

Para quem não sabe, este cargo resulta de uma eleição entre os médicos que habitam e trabalham em cada Estado e é renovado a cada 5 anos.
Para meu orgulho, é meu tio querido e admirado.

7 comentários:

opcao_zili disse...

Nobre cacique, parabéns pelo excelente artigo de seu tio. Claro,acadêmico,esclarecedor, incontestável. Transmita a ele meus cumprimentos.

Robson Franco disse...

Muito bom o tema para reflexão e colocado de uma forma sem juízo de valor.
Particularmente sou ateu, mas costumo dizer que minha fé é inabalável, pois fé nada tem a ver com religiosidade!
Aborto? Há casos em que ele deve ser feito e estão previstos em lei.

Unknown disse...

Bastante esclarecedor, parabéns.

DominioFeminino disse...

Excelente. Para lembrar aos leitores - porque o autor sabe bem melhor -, Imediatamente à concepção o sistema endócrino feminino passa a fabricar os hormônios necessários à vida do embrião. As gonadotrofinas coriônicas iniciam seu banho. Tão logo cesse o fornecimento, então têm-se o aborto espontâneo ou o cessar acontece ao final da gestação, em seguida ao parto. Por que, então, tanta sofisticação do organismo feminino, se não for para gerar vida ? Apenas uma consideração diferentemente da contida no artigo, é que a concepção não é uma consequência da prática do sexo e sim seu objetivo procriativo. No mais, uma beleza de argumentação. Parabéns Cacique.

Marineide Dan Ribeiro disse...

Bravo! Parabéns pra ele!
Falou tudo!

Regina Brasilia disse...

Considerações de quem viveu, dentro, o momento de decisão do Conselho. Uma contribuição generosa do doutor e do Cacique, ao dividir conosco, o texto. Obrigada, Ajuricabat! Tenha a certeza de que as observações estão a ajudar quem precisa se informar, técnica e profissionalmente, inclusive, sobre o tema.

Anônimo disse...

Hello, just wanted to tell you, I lοvеd this blog post.
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